quarta-feira, 17 de junho de 2009

DIREITOS???






Pivete, trombadinha, moleque de rua. Essas expressões revelam o quanto a juventude da periferia é vista com temor e preconceito (mais preconceito do que temor na realidade) pela sociedade. Olhar este que leva setores da sociedade a pedir medidas punitivas cada vez mais rigorosas e até mesmo a redução da idade penal para coibir as infrações cometidas por esses jovens. As raízes desse pensamento encontram-se no nosso passado escravocrata.
Enquanto perdurou a escravidão no Brasil, os que eram vistos como fonte de problemas à ordem social eram os chamados "sem eira nem beira" (mendigos, desclassificados e vadios), que não tinham lugar na estrutura dual daquela sociedade dividida entre senhores e escravos.
Com a abolição, juntou-se a eles a massa de ex-escravos, que também passava a ser vista como trabalhadores subalternos ou classe perigosa. Não por outro motivo, uma das primeiras medidas adotadas pelo 1º Código Penal logo após a proclamação da República, em 1890, foi a redução da idade penal para os nove anos. Além disso, regulamentava-se o trabalho infantil, permitia-se a retirada do pátrio poder por motivo de pobreza e o envio dessas crianças, que passavam a ser definidas como menores abandonados material e moralmente, aos internatos correcionais. Iniciativas com que se procurava controlar jovens em situação de pobreza ou abandono.
Quadro que não mudou muito ao longo do tempo. Em 1905, numa inspeção às casas de detenção do estado, Franco Vaz constata numa delas a presença de 18 menores, cujos delitos variavam entre "ter atirado uma pedra num comerciante que o agredira", "ter sido apanhado perambulando ou dormindo na rua". Mais surpreendente é a recomendação de seu relatório. Vaz acha que a idade penal precisa ser aumentada, mas que os menores "abandonados moralmente" deviam permanecer em um internato correcional até os 18 anos, "para a sua proteção".
O avanço legal chega com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, lei complementar à Constituição de 1988. Com ele, deixa de existir o menor carente ou infrator como objeto do assistencialismo ou das penas da lei, e passamos a ter crianças e adolescentes como sujeitos plenos de direitos. Pelo estatuto, por exemplo, infrações leves incorrem em medidas não privativas de liberdade, como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade ou liberdade assistida. Todas estas medidas devem ser tentadas antes da privação de liberdade, que de acordo com o estatuto é reservada apenas para os atos infracionais cometidos mediante grave ameaça ou violência à pessoa, por reiteração no cometimento de atos infracionais graves ou pelo descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente imposta.
O estatuto garante à criança e ao adolescente direitos de cidadania que devem ser assegurados pela implementação de políticas sociais públicas que permitam uma vida com dignidade. É uma luta histórica. Mas apesar das esperanças depositadas na Constituição de 1988, especialmente no que se refere a direitos humanos, a realidade não correspondeu às expectativas, assim como o Estatuto das Cidades, a Reforma Sanitária ou a Reforma Agrária, o Estatuto da Criança e do Adolescente é letra morta, o que está assegurado na constituição não nem perto da realização na prática.
Na prática, embora os pais não possam mais ser destituídos do pátrio poder por motivo de pobreza, isso continua acontecendo, sob a alegação de "negligência", o que muitas vezes mascara situações de extrema carência da família. O problema não é só da criança, mas de toda uma classe. Os trabalhadores pais que não têm condições básicas de se manter, não terão como manter os filhos.
Houve avanços e recuos nesse meio tempo, como a universalização do ensino fundamental. Mas não se conseguiu estender essa universalização do ensino ao adolescente, mantendo-o na escola, não se extinguiu o trabalho infantil, que ainda é fonte de renda familiar, e aumentou o extermínio de jovens do sexo masculino.
Situações que podem ser apontadas no estudo realizado em 2001 com 50 adolescentes internados no Instituto Padre Severino, no Rio de Janeiro. Nele, identificou-se o seguinte perfil: 82% dos adolescentes estavam fora da escola quando praticaram o último ato infracional; 96% começaram a trabalhar ainda criança para garantir sustento próprio ou da família; 50% perderam um ou mais membro da família (pai, mãe, irmão) por mortes violentas (acidentes ou assassinatos) ou por doenças graves mas passíveis de tratamento (tuberculose, hanseníase, complicações do pós-parto, Aids); 50% eram considerados reincidentes e 34% e 10% foram acusados de tráfico e uso de drogas, respectivamente.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

JUVENTUDE-CULTURA





A juventude não pode ser encerrada apenas pela determinação quantitativa de uma condição etária, ela se define especialmente como momento qualitativo em que o futuro da vida está sendo decidido. a juventude caracteriza-se pelo pico do conflito entre POTENCIAL CRIATIVO X BLOQUEIOS DO SISTEMA. Quando falamos e juventude da classe trabalhadora esse conflito soma-se ao maior conflito do sistema capitalista: CAPITAL X TRABALHO, isso porque a juventude se lança cada vez mais cedo no mercado de trabalho, devido a condição de penúria cada vez pior das famílias de origem popular. Por estar no momento da vida de tomada de decisões, com o futuro incerto e com o peso das contradiç+oes nas costas, estas decisões se dão sob forte tensão e sob figura da angústia.
A saída do homem moderno angustiado é a revolta. O que pode adquirir dimensões sociais explosivas. Mas essa revolta geralmente não se dá com um caráter estritamente político. Pode ser a mais despolitizada possível. Na verdade ela é a busca de uma nova forma de reconhecimento, alternativas a aquelas que o sistema bloqueou. É fundamentalmente a partir disso que a juventude vai se identificar pluralmente em diversas formas de reconhecimento: religião, modismo consumista, comunidades alternativas, nos esportes, na política, nas drogas, na violência, na apatia, no suicídio, na música e nas artes, nos movimentos culturais. Nada disso impedindo que tais manifestações se comuniquem ou se rearticulem de diferentes graus entre si.
Apesar do juízo simplista de uma certa esquerda, é socalmente superficial, historicamente falso e politicamente equivocado identificar a juventude com o progressismo. Na Alemanha nazista por exemplo a juventude nazista era muito mais numerosa do que a juventude socialista do grande Partido Social Democrata de Kautsky e Rosa Luxemburgo.
Contra a visão de que a juventude é algo quase "naturalmente" progressista-que bastaria a esquerda agitar suas bandeiras para conquistar sua adesão- o melhor entendimento, sobre este aspecto particular de formação ideológica juvenil, é o de Karl Mannheim, para quem a juventude não é nem progressista, nem conservadora. É uma enorme potencialidade em disputa. E é neste sentido que a cultura se investe de enorme valor na definição do modo de ser a juventude, em sua visão de mundo e em sua prática social e política.
Enquanto a direita prega, a seu modo, o fim da ideologia, as organizações de esquerda tem, em contrapartida, a tarefa de retomada do valor do conhecimento, da relação dialética entre as culturas popular e erudita, da relação do homem com a natureza e, assim, do espírito crítico e autocritico como um todo.
Trata-se de apostar na formação intelectual crítica da juventude, elemento importante para o que Gramsci chamou de luta contra hegemônica. Embate de idéias e valores, sim! Mas enraizado na vida real das lutas entre as classes, que hoje não podem mais ignorar os temas ecológicos, étnico e de gênero. Questões estas, entretando, que só encontram sentido radical se vinculados ao projeto de uma luta mais geral.
A exigência da crítica como forma de negação em andamento não deve, porem, soterrar a clareza de que mais importante que aferir moralmente o grau imediato de politização da juventude é decifrar dialeticamente o significado social e político daquilo que a juventude está expressando à sociedade hoje. A percepção dessas culturas juvenis como modos contraditórios, porem legítimos, de ser/existir na sociedade capitalista, é um pressuposto para com elas dialogar a cultura de intervenção que vem da crítica teórica.
Do ponto de vista da emancipação, a relevância hitórica do binômio juventude-cultura está em saber se a resolução do que se chamou aqui de luta por um novo reconhecimento se dará (re)canalizando as energias da rbeldia juvenil em favor do próprio sistema, ou se se requalificará substancialmente, convertendo-se em necessidade radical, a qual, constitui uma demanda cuja exigência qualitativa não pode mais ser satisfeita nos marcos da sociedade capitalista.

Despejo Ocupação Dandara




A decisão do desembargador Tarcísio José Martins Costa é ESCANDALOSA. Ao determinar a reintegração de posse da área ocupada no Céu Azul, em BH ele expõe a fragilidade do sistema jurídico em Minas Gerais e a sujeição deste às pressões do poderio econômico das velhas oligarquias do estado.

Além de totalmente descabida do ponto de vista jurídico (ele revê uma decisão de um colega, emitindo liminar, ao invés de relatar o processo ao pleno do tribunal) ela favorece a Construtora Modelo, que não conseguiu comprovar a POSSE do terreno. O desembargador atropela dois Agravos de Instrumento, um da assessoria jurídica da Dandara e outro do Ministério Público, que questionavam a incompetência da ação de despejo da construtora e a falta de posse do terreno. Ficou provado nos autos que a construtora além de NUNCA ter exercido a posse real da área usou de má fé anexando um projeto arquitetônico referente a outra área em bairro distinto. Mas o Sr Tarcísio considerou de sua própria cabeça amparar a competência do processo e justificou a posse com base na “disposição” de uso do terreno por parte da construtora. Ou seja, legitimou a especulação da propriedade, rasgou a Constituição no seu artigo 5 inciso 23 que prevê que “a propriedade atenderá sua função social”.

Além disso, pairam no ar questões relativas à PROPRIEDADE mesma do terreno. Ele foi um dia um terreno público. Isto é afirmado por todos da comunidade do entorno e por técnicos de dentro do governo do estado (que nos afirmaram pedindo anonimato). Fato é que a única construção moderna de alvenaria dentro da área é exatamente a Escola Estadual Manoel Costa. Quem concedeu a construção desta escola? Se foi um particular, onde está o documento que o prova? A grande dúvida é: se o terreno realmente pertenceu ao estado um dia, como foi parar na mão de particulares? Quem doou? Se foi vendido, qual foi o preço praticado? Esteve de conforme com a legislação e a cotação de mercado?

Para complementar, resta a condição fiscal do terreno. Consta na petição inicial do processo que há uma dívida de mais de um milhão de reais de impostos não pagos. Ou seja, além de se apropriarem indevidamente de patrimônio público, possivelmente também a construtora lesa os cofres públicos sonegando impostos. Por detrás da modelo, estão os mesmos grupos que afundaram o mercado imobiliário mineiro através da COJAN na década de 80, lesando milhares de consumidores. Temos relatos documentados das práticas abusivas da Construtora Modelo LTDA e a Lótus Empreendimentos e Participações S/A, sua empresa-irmã, que cobram juros de 300% sobre o valor do imóvel financiado e retém 75% do valor pago em caso de inadimplência dos mutuários. Estes processos foram parar do STF!!!! No site do TJMG é possível pesquisar os nomes das duas empresas e chegar a mais de 2000 processos (ativos e baixados) somente nas comarcas de BH e Betim.

Por fim, denunciamos o descaso do Poder Público. A Prefeitura se nega a nos receber e o Governo do Estado silencia e esconde a situação das mais de mil famílias amordaçando a mídia. O despejo, se ocorrer, só agrava a situação, bota na rua estas pessoas.

PEDIMOS A TODOS E TODAS QUE ENVIEM FAX E EMAIL PARA O SR DESEMBARGADOR PARA QUE ESTE POSSA REVERTER SUA DECISÀO MONOCRÁTICA. ISTO É POSSIVEL DE ELE FAZER.

FAX: (31) 3225-9708 (endereçados à 9ª Câmara Cível de Belo Horizonte)

Email: caciv9@tjmg.jus.br, (email da câmara) e gustavo.neiva@tjmg.jus.br (assessor do desembargador)

Questão Urbana


Como explica a urbanista Raquel Rolnik, nunca houve falta de planejamento na formação das cidades brasileiras; houve, sim, muito planejamento. "Para os pobres, sempre foram destinadas as piores terras, as mais feias, longe das oportunidades culturais, educacionais e de emprego que a cidade oferece..." O resultado foi a expansão de conjuntos habitacionais de péssima qualidade, que acabaram virando cidades-dormitório. Até mesmo quando há escolas, creches e postos de saúde, esses serviços são de qualidade muito inferior aos do centro. Construídos sob medida para os subcidadãos. "Quem assistiu ao filme Cidade de Deus vai lembrar que Cidade de Deus foi um conjunto habitacional produzido pela Cohab do Rio de Janeiro. Aquelas casas foram feitas para os pobres morarem, e aquilo não é cidade", lembra Rolnik.

A nova política de habitação popular promovia ainda a remoção maciça das favelas, a chamada higienização urbana,que até a década de 70 ocupavam terrenos nas áreas centrais. As cidades se expandiram horizontalmente a perder de vista, causando sérios problemas econômicos e ambientais. Além disso, a implantação de infra-estrutura em áreas longínquas é difícil e cara, enquanto toda a infra-estrutura do centro permanece subutilizada durante a noite e nos fins de semana. E mais: depois de construídos, muitos conjuntos foram abandonados à própria sorte. Foi o que aconteceu com o Cidade de Deus.

Outra faceta do BNH é a exclusão dos próprios excluídos. Durante seus 22 anos de existência, o BNH construiu 4 milhões de unidades, mas destinou apenas 18 por cento às famílias com renda inferior a cinco salários mínimos. Assim, a grande maioria dos trabalhadores continuou resolvendo o seu problema sozinha, produzindo cada vez mais soluções precárias e sem nenhuma relação com a cidade em que que vive. Uma outra cidade, à margem, excluída, paralela.
Vazios
Mas o avesso dessa política também dá as cartas no quadro habitacional do país. Da mesma maneira que vão surgindo submoradias aos borbotões, surge um outro fenômeno típico das cidades brasileiras: os vazios urbanos.

Não só terrenos baldios, como aqueles ocupados pelos movimentos sociais e organizações políticas, mas apartamentos, casas e prédios inteiros vazios. Por mais tragicômico que isso pareça, a lógica é simples: há muito mais terras, casas e espaços comerciais destinados para a burguesia do que burguesia para ocupar. "Como se exclui totalmente os pobres da lógica do planejamento e da legislação urbanística, ocorre uma sobreoferta de pedaços urbanos no centro das cidades com infra-estrutura, qualidade habitacional e urbanística", diz Raquel Rolnik. De fato, há 4,6 milhões de domicílios vagos nas zonas urbanas brasileiras, o que representa 10 por cento do total. "Dois exemplos muito claros são Uberlândia e Goiânia, onde tem 40 por cento da terra vazia e subutilizada. E no centro de São Paulo são mais de duzentos edifícios residenciais inteiramente vazios." Em Belo Horizonte, segundo pesquisa da fundaç+ao João Pinheiro em 2002, os imóveis vazios ultrapassam a margem de 70 mil unidades enquanto o déficit habitacional está a margem de 55 mil famílias.
O que está por trás dessa lógica desumana é uma política urbana que dialoga apenas com segmentos restritos da sociedade. Assim como na educação e na saúde, a própria cidade foi largada a cargo das leis de mercado. Só que a cidade, abarca a todos; há pouca chance de escapar da desordem. A burguesia acaba se fechando em condomínios privados com muros altíssimos e guardas com cara de mau, e, como diria Rolnik, isso também não é cidade. (...)